sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

AGRONEGÓCIO - Contradições do modelo agrícola brasileiro.

Do blog Matutações

Matutações

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A “arquitetura porosa e criativa” posta à prova – Parte II – Kátia Abreu entra na disputa dos fazendeiros contra a Monsanto


A combativa senadora ruralista Kátia Abreu
A combativa senadora ruralista Kátia Abreu
A ação judicial impetrada por fazendeiros mato-grossenses contra o pagamento de royalties à Monsanto referentes a 2011 e 2012 está longe de um acordo final.
Agora, Kátia Abreu e a sua Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) entram em cena.
E qual é o grande interesse deste imbróglio?
É que ele expõe, de forma cristalina, certas contradições do modelo agrícola brasileiro, louvado por gregos e troianos como a solução, senão de todos, de muitos dos problemas que afligem o Brasil, e mesmo a Humanidade.
O enredo desta peça expõe, a um só tempo a) a fragilidade da soberania do Brasil em determinar os prazos de patentes internacionais em território brasileiro (O Brasil diz que a patente da soja Roundup Ready, em seu território, terminou em 2010, a Monsanto só reconhece os prazos da patente internacional, que vão até 2014; b) a fragilidade do modelo do plantio direto, um dos carros-chefe da agricultura brasileira, defendido, incentivado e exportado pela Embrapa, e que, para funcionar e produzir esses indíces fantásticos de produtividade, precisa da aplicação de herbicidas, e tem na Monsanto – com o seu famoso herbicida Roundup Ready e a sua não tão famosa associação à Embrapa para desenvolvimento de sementes imunes ao herbicida – uma de suas peças principais. (O tema do plantio direto, a sua adoção pela Embrapa, e a sua dependência de multinacionais como a Monsanto é tema a ser desenvolvido aqui em breve, conforme já anunciado)
Por enquanto, fiquemos com a narrativa do correspondente de uma revista agrícola estadunidense, que, comparada com as notícias veiculadas na imprensa nacional, é a mais detalhada e acessível ao público que não acompanha a estória desde o começo. (Leia a notícia criptográfica da Folha de São Paulo – aqui ou aqui -, que não informa o contexto, e só é inteligível a quem já conhecia o assunto)

CNA rejeita acordo na disputa dos royalties da Monsanto

por Alastair Stewart para a Progressive Farmer em 21/02/2013
A CNA, a maior associação de agricultores do Brasil, retirou o apoio a um acordo proposto pela Monsanto para encerrar a disputa sobre os royalties da primeira geração de soja geneticamente modificada Roundup Ready (RR1) [1].
A mudança de tom se deve ao fato da Monsanto condicionar, no acordo, o licenciamento da segunda geração de soja geneticamente modificada Intacta RR2 Pro (RR2), que a líder mundial em sementes pretende introduzir no mercado na próxima temporada.
O anúncio representa um choque para a gigante de biotecnologia sediada em Saint Louis, nos Estados Unidos, que quis se aproveitar da situação para comercializar e garantir a cobrança de royalties da RR2.
Em 23 de janeiro deste ano, a CNA fez uma declaração conjunta com 10 federações estaduais de agricultores apoiando o acordo segundo o qual a empresa suspenderia a cobrança de royalties da soja RR1 nesta e na próxima temporada. Em troca, os agricultores concordavam em retirar as ações contra o pagamento de royalties referentes aos dois últimos anos.
Seria um acordo bom para ambas as partes na disputa pela cobrança de patentes. A Monsanto argumenta que a sua patente internacional da RR1 termina em 2014 e que portanto o Brasil teria que acatar essas condições. Mas os agricultores brasileiros argumentam que a patente da RR1 registrada no Brasil, expirada em 2010, tem precedência sobre a patente internacional – uma posição que foi reforçada pela decisão favorável aos agricultores brasileiros pelo tribunal de Mato Grosso, no ano passado.
A declaração conjunta era apenas uma formalização em termos genéricos, que deveria ser seguida de acordos individuais entre a Monsanto e os agricultores que entraram na justiça. Entretanto, a associação de agricultores do Mato Grosso, o estado que lidera a produção de soja no Brasil, rejeitou o acordo, argumentando que eles estavam bem fundamentados na sua ação.
Agora, a CNA reconhece que os acordos individuais entregues pela Monsanto aos agricultores vai muito além dos termos gerais da declaração.
“A CNA rejeita os acordos individuais que a Monsanto apresentou aos produtores de soja,” diz a entidade numa declaração feita na última quarta-feira.
Os termos dos acordos individuais oferecidos aos agricultores não apenas mencionavam a retirada da ação contra a cobrança de royalties da RR1 nos últimos dois anos, como também obrigava os agricultores a reconhecer os direitos da Monsanto de cobrar royalties sobre a venda de sementes RR2, ou sobre a safra proveniente da plantação dessas sementes.
A CNA está correta em dizer que a declaração não mencionava nada a respeito da soja RR2, mas a Monsanto diz que publicou os termos dos acordos individuais no dia em que a declaração foi feita. Assim, muitos consideraram o documento como um endosso dos acordos individuais, embora pareça bastante plausível que a CNA tenha assinado a declaração sem vê-los.
O que deve ter acontecido é que, mais tarde, a CNA analisou com mais rigor as implicações legais referentes à cobrança de royalties sobre a produção da soja RR2, bem como sobre a comercialização de sementes, e acabou por rever a sua posição.
Tentei obter da CNA uma explicação sobre essa mudança de posição, mas até agora não consegui obter nada.
Na declaração, a CNA expressa o seu “repúdio” à atitude da Monsanto e exige a anulação de todos os acordos individuais assinados desde 23 de janeiro.
A CNA afirma que obteve garantias verbais de que acordos eventualmente já assinados seriam rasgados, mas um porta-voz da Monsanto se recusou a confirmar essa informação na terça-feira de manhã.
Entretanto, a Monsanto parece disposta a ceder. Numa declaração de três linhas, a empresa diz que mantém um “diálogo aberto” com a CNA e com as federações de agricultores e que já tinha enviado acordos individuais com outros termos, para análise dos agricultores.
A empresa de biotecnologia queria terminar o imbróglio dos royalties da soja RR1 antes do lançamento da RR2, que só está dependendo da aprovação das autoridades chinesas, os maiores importadores da soja brasileira.
O acordo inicial com a CNA já tinha resolvido grande parte da questão. Agora, tudo parece ter voltado à estaca zero.
Fonte: http://www.dtnprogressivefarmer.com/dtnag/view/blog/getBlog.do;jsessionid=2845783D15758BE4FB6F7AB6E6BA3906.agfreejvm1?blogHandle=southamerica&blogEntryId=8a82c0bc3c43f322013cfdb9b3b90768

Notas de Matutações:

[1] A soja Roundup Ready é uma soja geneticamente modificada pela Monsanto para torná-la imune ao herbicida Roundup, também produzido pela empresa.

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