Por Marco Antonio L.

A “República dos Gorilas”: ditadura ensinou indígenas a torturar

Do Portal O Vermelho

Neste 15 de novembro o Brasil lembra os 123 anos da Proclamação da República. O movimento, liderado pelo Marechal Deodoro, primeiro presidente do país, expulsou Dom Pedro II do Brasil e iniciou a “República da Espada”. Apenas 75 anos depois, um golpe depôs a democracia tão árduamente construída para impor a “República dos Gorilas”: a ditadura militar. Para se livrar de pressões externas e não ter seu planos de expansão alterados, a ditadura criou na década de 1970 a Guarda Rural Indígena (Grin).
Segundo a portaria que criou a guarda, no ano de 1969, a tropa teria a missão de "executar o policiamento ostensivo das áreas reservadas aos silvícolas".
A formatura da primeira turma da guarda foi composta por 84 índios recrutados em aldeias xerente, maxacali, carajá, krahô e gaviões que aparecem em cenas gravadas há 42 anos e reveladas pelo pesquisador Marcelo Zelic, 49, vice-presidente do Grupo Tortura Nunca Mais/SP e membro da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo.
As imagens foram encontradas no Museu do Índio, no Rio de Janeiro, em um DVD com o título "Arara", fruto da digitalização de 20 rolos de filme 16 mm, sem áudio.

A etiqueta levava a crer que se tratava de material sobre a etnia arara – indígenas conhecidos nas cercanias de Altamira (PA) desde 1850. Mas, em vez do "povo das araras vermelhas", como se denominam até hoje seus 361 remanescentes (dados de 2012), era outra "arara" que nomeava a caixa.
Tratava-se de pau de arara, a autêntica contribuição brasileira ao arsenal mundial de técnicas de tortura, usado desde os tempos da colônia para punir "negros fujões", como se dizia. Por lembrar as longas varas usadas para levar aves aos mercados, atadas pelos pés, o suplício ganhou esse nome.
O filme é parte do acervo sobre 60 povos indígenas, coletado durante quatro décadas pelo documentarista Jesco von Puttkamer (1919-94) e doado em 1977 ao IGPA (Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia), da Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
Museu do Índio x Copa do Mundo
A grande ironia desta descoberta é que o Museu do Índio, responsável pela digitalização das imagens inéditas que você viu acima, agora poderá ter a sua primeira sede demolida.
Criado em 1953 por Darcy Ribeiro, o museu – única instituição oficial no país exclusivamente dedicada às culturas indígenas – funcionou até 1978 no bairro do Maracanã, mudando-se do casarão, na Rua Mata Machado, para o espaço atual, na Rua das Palmeiras, em Botafogo.
As únicas obras que permanecem no casarão original são nada mais nada menos do que os propríos índios, ao vivo e a cores. Verdadeiros sem teto da cidade grande, eles ocuparam o prédio abandonado o transformaram na Aldeia Maracanã, em um centro irradiador da cultura indígena.
Como o espaço fica ao lado do estádio que sediará parte dos jogos da Copa do Mundo, o governador Sérgio Cabral (PMDB) já avisou que vai derrubar o prédio e expulsar os indígenas do local.

"O Museu do Índio, perto do Maracanã, será demolido. Vai virar uma área de mobilidade e de circulação de pessoas. É uma exigência da Fifa e do Comitê Organizador Local. Viva a democracia, mas o prédio não tem qualquer valor histórico, não é tombado por ninguém. Vamos derrubar", argumentou Sérgio Cabral em outubro.
Porém, a Fifa desmentiu as declarações de Cabral em um documento, enviado pela entidade à Defensoria Pública da União (DPU) e assinado por Fulvio Danilas – diretor do Escritório da Fifa no Brasil – que afirma: “a Fifa nunca solicitou a demolição do antigo Museu do Índio ao governo do RJ ou a qualquer outra autoridade”.
Em, apoio à Aldeia Maracanã, a Justiça Federal fará uma perícia no prédio do antigo Museu do Índio. De acordo com o defensor público da União, Andre Ordacgy – que ingressou com duas liminares na Justiça em ações civis públicas para evitar a derrubada do prédio – a vistoria foi marcada para o próximo dia 21 pela juíza titular da 12ª Vara Federal Cível, Edna Carvalho Kleemann. A magistrada estará acompanhada de um perito judicial com o objetivo de determinar se o imóvel é recuperável e se sua permanência no local de fato atrapalharia a dispersão de público do estádio durante os jogos da Copa.
A luta contra a demolição da Aldeia Maracanã se soma a outras reivindicações indígenas que ganharam adesão nas redes sociais. Entre elas está a imediata revogação da portaria da Advocacia-Geral da União, que prevê a possibilidade de o setor público construir em áreas indígenas sem consultar seus habitantes (a ideia, pelo que eu entendi, é que as reservas não sejam reservadas!?), e a demarcação de terras para os povos Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul.

É, parece que as “aulas” de tortura para os indígenas evoluíram muito da ditadura militar para o século 21. Afinal, a prática é o melhor critério da verdade.
Por Carla Santos,
Da redação