domingo, 8 de julho de 2012

MERCOSUL - Entrada da Venezuela no Mercosul.

Contraponto 8650 - "Entrada da Venezuela no Mercosul é mais econômica que política"
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Da Carta Capital

A adesão da Venezuela do presidente Hugo Chávez ao Mercosul ainda levanta polêmica. Foto: Presidência da Venezuela / AFP
Gabriel Bonis
A entrada da Venezuela no Mercosul como integrante pleno do bloco, confirmada na semana passada, ainda provoca discordâncias na América do Sul. A chancelaria paraguaia pretende ir aos tribunais do Mercosul para provar que Argentina, Brasil e Uruguai violaram as regras do bloco ao suspender o Paraguai e ao permitir a adesão venezuelana.

No Uruguai, a entrada da Venezuela provocou uma crise política. O vice-presidente, Danilo Astori, e o chanceler, Luis Almagro, criticaram a forma como a adesão foi aprovada. No Brasil, o governo é acusado de agir ideologicamente. Em primeiro lugar, para punir o Paraguai, agora dominado por grupos direitistas que conseguiram destituir o ex-presidente Fernando Lugo. Em segundo lugar, para favorecer a Venezuela do bolivariano Hugo Chávez. Analistas ouvidos por CartaCapital, entretanto, avaliam que a entrada da Venezuela no Mercosul tem um fundo estratégico para o Brasil, e não político – o que poderá ajudar a revitalizar o bloco.

Mais do que o “socialismo do século XXI” defendido por Chávez, interessam ao Brasil e ao Mercosul os aspectos econômicos da Venezuela, notadamente seus 30 milhões de consumidores e sua capacidade de gerar energia. A Venezuela é dona das maiores reservas de petróleo cru do mundo, com 296,5 bilhões de barris, contra 264,5 bilhões da Arábia Saudita. Esses fatores precisam ser levados em conta e colocados acima da questão ideológica. “A decisão (de aceitar a Venezuela no Mercosul) foi obscurecida por estar ligada ao governo Chávez, mas ele eventualmente vai deixar o comando do país, e não se pode confundir interesse de médio a longo prazo com o chavismo”, diz o economista Roberto Teixeira da Costa, presidente da Câmara de Arbitragem da Bolsa de Valores de São Paulo. Costa critica a forma como a Venezuela foi inserida no Mercosul, mas avalia que o país agrega muito ao bloco e será capaz de revitalizá-lo. “A Venezuela gera energia e renda. Vai ter necessidade de consumir e o Mercosul terá uma condição de ser fornecedor importante de bens, produtos industriais e serviços, como empresas multinacionais”, afirma.

Ao fortalecer o Mercosul, a Venezuela estará também fortalecendo a posição do Brasil. O bloco foi criado, sobretudo, para afirmar as relações de Argentina e Brasil, as duas potências regionais sul-americanas. Com o passar o tempo, o Brasil se tornou o país mais importante da América do Sul e a Argentina tem perdido espaço, num momento no qual outros países ganham relevância, como a Colômbia. Soma-se a isso, o crescente interesse comercial de Estados Unidos e China na região.

Segundo Giorgio Romano Schutte, coordenador do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC, é importante que o Brasil seja visto cada vez mais como o dono da posição hegemônica no continente. “Em um mundo multipolar, o lugar que o Brasil deve se inserir é na América do Sul. Uma região fragmentada submetendo-se aos interesses de empresas e países estrangeiros é ruim para o País”, afirma.

Um Mercosul com mais membros plenos também pode trazer maior estabilidade à região. Constantemente Paraguai e Uruguai, as menores economias do bloco, se veem em posição desconfortável em relação a Brasil e Argentina. Sentem-se com menor expressão política no bloco, além de pressionados geograficamente. A Venezuela poderia, então, diluir essa bipolaridade entre “fortes” e “fracos” e ampliar o equilíbrio.

A chicana golpista não foi aceita nem pelos governos conservadores. Só por jornalistas e políticos pró-EUA. Foto: Enrique Marcarian/Rreuters/Latinstock
“Esquerdização” do Mercosul?

A entrada da Venezuela no Mercosul, entretanto, só será positiva e fortalecedora se o país aceitar as regras vigentes do bloco e incorporar a legislação regional a suas leis locais. O papel do Brasil será fundamental para essa adaptação. “O Brasil presidirá o bloco nos próximos seis meses e vai liderar esse processo de integração, que também coincide com a eleição presidencial venezuelana”, diz Schutte. “Essa presidência coloca o Brasil na obrigação de fazer com que o governo da Venezuela aposte na realização do projeto sul-americano para evitar que haja polarização naquele país sobre a entrada no bloco”, diz.

Ao mesmo tempo em que trabalha para evitar polarização dentro da Venezuela, o Brasil deve evitar uma polarização direita-esquerda regional. Deve, sim, fazer com que a estrutura do bloco continue pragmática e que preveja negociações em todos os campos. Tullo Vigevani, especialista em Mercosul da Universidade Estadual Paulista, lembra que desde a criação do Mercosul, os quatro países fundadores tiveram mudanças importantes nas posições de ideologia de seus governos sem interrupção dos projetos regionais. “É importante destacar o esforço do governo brasileiro para fazer com que a Venezuela aceite e ratifique os acordos do bloco na sua integralidade ainda que com medidas de transição de longo prazo”, diz. “Isso garante que mesmo que haja mudanças políticas, o país continuará interessado no bloco”, afirma.

A Venezuela no bloco

O comércio brasileiro com a Venezuela em 2011 somou cerca de 5,85 bilhões de dólares, com saldo positivo acima de 3,3 bilhões de dólares. Segundo a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Venezuela, os produtos manufaturados representaram 55,1% das exportações brasileiras ao país caribenho. Com o Mercosul, a troca comercial também é significativa. No último ano, foi de mais de 4,6 bilhões de dólares com balança positiva de cerca de 1,8 bilhão para o bloco. Mas apenas Brasil e Argentina possuem saldo positivo nesta relação. Justamente os países com indústria mais forte do bloco. Uruguai e Paraguai estão no negativo, principalmente porque dependem do petróleo venezuelano.

De acordo com dados do Banco Mundial de 2010, o bloco soma agora quase 3 trilhões de dólares em PIB, em um mercado consumidor de 274 milhões de pessoas.

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