terça-feira, 17 de janeiro de 2012

RELIGIÃO - Pós-1980: uma geração sem Deus.

Aumentam os italianos no Colégio Cardinalício, mas a fé se enfraquece com um crescimento impressionante da indiferença religiosa entre os jovens e as mulheres.

A reportagem é de Marco Rizzi, publicada no caderno La Lettura do jornal Corriere della Sera, 15-01-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

A Itália ainda tem um arraigada alma católica? O "sim" pareceria óbvio se considerássemos as nomeações cardinalícias recém-anunciadas pelo Papa Ratzinger (dos futuros 22 cardeais, dos quais 18 eleitores, sete, todos eleitores, são italianos, mesmo que apenas um não pertença à Cúria Romana) ou a ênfase da mídia sobre o renascido protagonismo dos católicos que acompanhou a formação do governo Monti. Porém, se deslocarmos a atenção da crônica imediata para tentar entender quais são as tendências em curso no país, a resposta torna-se menos óbvia. Três recentes pesquisas oferecem indicações inesperadas e permitem algumas hipóteses de perspectiva.

Todos concordam em identificar três rupturas que atravessam a Itália católica. A primeira, evidenciada particularmente por Roberto Cartocci, é de caráter geográfico: enquanto abaixo de uma hipotética linha traçada entre Roma e Pescara persiste um catolicismo de traços fortemente tradicionais, no Centro Norte o processo de secularização experimentou nos últimos 20 anos uma fortíssima aceleração, que levou uma significativa proporção da população, especialmente nos maiores centros habitados, a se afastar da Igreja e da prática religiosa em seus vários aspectos. Deve-se enfatizar que uma área anteriormente solidamente católica como o Nordeste está agora mais próxima de outras áreas da região toscana-emiliana, historicamente a mais secularizada do país.

A segunda ruptura refere-se à relação entre os fiéis e o ensinamento da Igreja. Difunde-se uma religiosidade genérica, desconectada de conteúdos doutrinais e éticos específicos: se cerca de 73% dos italianos, segundo Franco Garelli, consideram que cabe à consciência individual estabelecer o que é certo e que, por exemplo, é possível ser um bom católico mesmo sem se conformar aos preceitos da moral sexual, mais de um italiano em cada dois nega que exista uma única religião verdadeira e deseja um substancial sincretismo entre as grandes tradições religiosas do mundo. Se o adversário a ser combatido é o relativismo, para a Igreja Católica a batalha já parece estar, portanto, comprometida pela metade.

A terceira ruptura é menos visível, mas parece ser mais decisiva: os nascidos a partir dos anos 1980 são mais indiferentes à religião do que qualquer outra geração anterior, na medida de 15%. Chega-se a 20% de jovens que não têm nenhuma confiança na Igreja Católica nem consideram válida a identificação entre "católico" e "italiano". Também se desfaz a maior religiosidade das mulheres, que, entre as nascidas depois de 1980, mostram as mesmas atitudes dos seus pares masculinos.

O único dado em contratendência, mesmo que bem distante de compensar a tendência geral, é a inversão da atitude masculina com relação à religião segundo o nível de educação: agora a indiferença cresce entre os menos escolarizados, e diminui entre os que estudaram mais. Como observam Gianfranco Brunelli e Paolo Segatti, estamos diante de um verdadeiro salto geracional, não simplesmente de uma aceleração no processo de secularização.

Essa última ruptura induz a que se dê um passo a mais, só indicado pelas pesquisas que se limitam a falar de uma "religião à italiana" ou de uma Itália "genericamente cristã e não mais católica". Pode-se supor que aquelas 15-20% de jovens pós-1980 que não manifestam nenhum interesse pelo catolicismo e que estão agora começando a ter filhos não terão nenhum interesse em batizá-los nem a lhes oferecer uma educação religiosa, ainda mais que o tradicional canal feminino para a transmissão da fé também parece estar, como visto, em declínio.

Pode-se argumentar, portanto, que, dentro de não muito tempo, mesmo na Itália, haverá uma componente visível de crianças não batizadas, que, juntamente com aqueles 5% da população que pertencem a outras fés (entre os quais os cristãos não católicos são apenas uma parte), tornará cada vez mais difícil falar de uma Itália pura e simplesmente católica, mesmo que apenas em termos socioculturais – e, por exemplo, justificar a manutenção da aula de religião, assim como é atualmente entendida.

Tudo isso apresenta grandes desafios à Igreja italiana. Acima de tudo, repensar canais eficazes de transmissão da fé e as próprias estratégias da sua presença na sociedade, se se quiser impedir que a Itália se assemelhe rapidamente às sociedades europeias mais secularizadas. De fato, para compensar o abandono da fé não parece ser suficiente a maior propensão à natalidade dos fiéis, como observou Rodney Stark nestas páginas. Os seus estudos sobre a difusão do cristianismo primitivo mostram justamente que também são importantes a mediação feminina e, sobretudo, a permeabilidade e o intercâmbio com a sociedade circundante.

Agora, a partir dos anos 1980, a Igreja italiana liderada pelo cardeal Camillo Ruini buscou um projeto de forte compactação interna e de direta ação no cenário político e legislativo, contando com o protagonismo de movimentos como o Comunhão e Libertação ou a Comunidade de Santo Egidio. No entanto, para preservar compactação, os movimentos tendem a estabelecer fortes fronteiras com o exterior e a favorecer a endogamia. Passado o boom inicial, o seu crescimento numérico e geográfica para, e o número dos aderentes se estabiliza, como é fácil constatar. Assim, criou-se uma evidente contradição entre um catolicismo comprometido cada vez mais com minorias e a pretensão de representar a alma do país, em nome da intrínseca catolicidade da Itália.

Sem dúvida, resultados significativos – em especial do lado do peso político da instituição – foram alcançados. No entanto, isso parece ter ocorrido a despeito dos conteúdos específicos da fé e da sua própria difusão. Insistir no projeto de uma renovada presença política dos católicos poderá sanar essa contradição, ou – para além dos resultados estritamente político-administrativos alcançados – contribuirá para agravá-la, a partir do momento em que todas as pesquisas confirmam que o fator religioso não é mais discriminatório para as escolhas políticas?

Ampliando o olhar, o que está acontecendo na Itália talvez deveria induzir a Igreja Católica a balancear melhor a sua própria atenção entre Europa – que, segundo o pontífice, "navega à vista, sem uma direção" – e os outros continentes, especialmente a África, a América Latina e a Ásia, onde, por causa das dinâmicas demográficas, estará em jogo grande parte do futuro.

Seguramente, como observou Alberto Melloni, não conta tanto o lugar de nascimento da elite eclesiástica, mas sim a sua disponibilidade para ouvir as diversas Igrejas. Além dos complexos equilíbrios curiais, sobre os quais Massimo Franco forneceu interessantes indicações no Corriere della Sera do dia 12 de janeiro, devemos nos perguntar se ainda não tem o seu peso uma visão eurocêntrica, para a qual as Igrejas da África, da Ásia e da América Latina continuam sendo, mesmo que apenas inconscientemente, "terras de missão" como há 30 anos, e não a fronteira decisiva para o catolicismo, em competição com a forte presença evangélica.

No fundo, o crescimento na América do Norte revelada por Stark também é devedora da imigração, hoje hispânica, e, há cem anos, italiana e irlandesa.
Fonte: IHU

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