quarta-feira, 19 de outubro de 2011

CRISE DA DÍVIDA - Principais jornais americanos: indignação é justa.

'New York Times' e 'Financial Times' dizem que indignação é justa


Jornal dos EUA critica em editorial a política de austeridade do Reino Unido; jornal britânico apoia o movimento Ocupar Wall Street. Ambos concordam que é justa a indignação contra o crescimento da desigualdade, o aumento da pobreza e dos sacrifícios.


Assembleia do movimento em Londres: o que espanta é que não tenha surgido há mais tempo. Foto de Occupy London

O The New York Times publicou um editorial sobre a política de austeridade levada a cabo pelo governo Cameron no Reino Unido. Por seu lado, o Financial Times publicou um editorial sobre o movimento Occupy Wall Street dos Estados Unidos. São editoriais cruzados: o jornal norte-americano fala sobre a política económica britânica; o jornal britânico fala sobre o movimento de contestação nos EUA. Ambos, porém, coincidem no centro da análise: é justa a indignação daqueles que viram os governos gastar biliões para salvar os bancos, ao mesmo tempo que nada fizeram para criar empregos.

“A austeridade é uma ideologia política disfarçada de política económica”

O editorial do diário de Nova York (Britain’s Self-Inflicted Misery [A miséria auto-infligida da Grã-Bretanha], de 14 de Outubro) sublinha que a “austeridade foi uma escolha ideológica deliberada” da coligação de Conservadores e Liberais Democratas liderada pelo primeiro-ministro David Cameron, ao contrário da Grécia, onde a austeridade foi imposta.

E, no entanto, fracassou, afirma o editorial, e é de esperar que continue na rota do fracasso. Desde os cortes orçamentais, a economia britânica praticamente não cresceu. Os dados do último trimestre indicam um crescimento de 0,1%. Ao mesmo tempo, o país defronta-se com o maior número de desempregados em mais de 15 anos (8,1%), e analistas independentes esperam que continue a subir nos próximos meses. O governo cortou mais de cem mil empregos no sector público, mas as políticas de redução do défice “não conseguiram reviver a confiança nos negócios que deveria estimular a contratação no sector privado”.

“Os drásticos cortes nos gastos públicos foram a estratégia errada de redução do défice para a enfraquecida economia britânica um ano atrás. E são a estratégia errada para a economia vacilante dos Estados Unidos hoje”, afirma o The New York Times.

“A austeridade é uma ideologia política disfarçada de política económica. Fundamenta-se num mito, que nada tem a ver com os factos, que retrata todos os gastos do governo como um desperdício, prejudiciais e desnecessários à recuperação. O mundo real é muito mais complicado. A América não precisa repetir a experiência fracassada do sr. Cameron”, conclui o editorial.

“Grito de mudança deve ser ouvido”

Já o editorial do Financial Times (America wakes to the din of inequity [A América desperta para o grito de iniquidade], de 16 de Outubro) afirma, em relação ao movimento Ocupar Wall Street e similares, que “só os imprudentes ignorariam um movimento que reflecte a raiva e a frustração dos cidadãos comuns de todas as esferas da vida em todo o planeta”.

O que está em causa, diz o jornal britânico, é o futuro do sonho americano. “Esse sonho foi destruído por uma crise provocada pelo excesso financeiro e pelo cinismo político. A consequência foi o crescimento da desigualdade, o aumento da pobreza e dos sacrifício por parte daqueles que menos condições têm de suportá-los – sem que nada disso consiga obter o crescimento económico”.

O editorial estranha que “tenha demorado tanto tempo para os cidadãos saírem em protestos populares além das fronteiras políticas”, criticando tanto os partidos republicano quanto o democrata dos EUA.

Por um breve período em 2010, houve esperanças de que o sonho americano iria prevalecer, diz o Financial Times. Mas o retorno de perspectivas económicas sombrias reforçou a impressão de que a classe política é irrelevante, ou pior, “está subordinada aos interesses financeiros, em detrimento do serviço público”.

“Ainda está para se ver se os protestos vão evoluir para um conjunto mais coerente de reivindicações, ou mesmo se vão dar origem a uma força política mais duradoura. Mas o grito de mudança deve ser ouvido”, conclui o Financial Times.

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