terça-feira, 30 de agosto de 2011

LÍBIA - Como a Al-Qaeda ganhou o domínio de Trípoli.

Quando interessa, os americanos esquecem com quem estão lidando. Foi assim na guerra Irã/Iraque, quando os EUA apoiaram Saddam Husseim,contra o Irã, foi assim quando a CIA treinou Osama Bi Laden no combate aos russos quando estes invadiram o Afeganistão, no que ficou conhecido como o Vietnan russo. Agora apoiaram logo quem, a Al-Qaeda, para derrubar o Kadaffi. No passado, um presidente americano declarou que os EUA não têm amigos e sim interesses.Enquanto isso a mídia ocidental torce desesperadamente para a queda do Kaddaffi. Como mostrei em outro post, até a BBC está fazendo manipulação na cobertura do que vem ocorrendo na Líbia. O mesmo fez a Al Jazeera que fez o mesmo que a BBC porém com menos repercussão.Ninguém mostra o que há por trás dessa "ajuda humanitária".Ninguém é a favor de uma ditadura, porém as favoráveis principalmente aos americanos, ninguém realiza "ajuda humanitária". Veja o que ocorreu no Bahein, onde as manifestações contra a ditadura lá existente foi sufocada por tropas da Arábia Saudita, atendendo à uma solicitação dos americanos. As manifestações no Bahein fizeram com que a FIA transferisse o Grande Prêmio desse país para o próximo ano. Com essa Resolução da ONU autorizando a "ajuda humanítária à Líbia, foi aberto um perigoso precedente. Agora qualquer governo que não agrade aos americanos, corre o risco de ser derrubado usando a nova polícia mundial representada pela OTAN. Me admira a passividade da China e da Rússia, principalmente os chineses, que têm grandes interesses na Líbia, permitirem que os americanos e a UE derrubem o Kadaffi para colocar um ditador seu amigo. Vocês acham que dá para acreditar que serão realizadas eleições daquí a oito meses?

Do site resistir.info


por Pepe Escobar [*]

Seu nome é Abdelhakim Belhaj. Alguns no Médio Oriente podem ter ouvido falar dele, mas poucos no ocidente o conhecem.

Já é tempo de saber. Porque a história de como um activo da al-Qaeda acabou por ser o principal comandante militar líbio na ainda devastada Tripoli liga-se ao estilhaçar – mais uma vez – dessa floresta de enganos que é a "guerra ao terror", bem como à profundamente comprometedora propaganda construída com todo o cuidado pela NATO de uma intervenção "humanitária" na Líbia.

A fortaleza de Muammar Gaddafi, Bab-al-Aziziyah, foi essencialmente invadida e conquistada pelos homens de Belhaj – que estavam na vanguarda de uma milícia de bérberes das montanhas a Sudoeste de Tripoli. A milícia é a chamada Brigada de Tripoli, treinada em segredo durante dois meses pelas Forças Especiais dos EUA. Ela revelou-se como mais efectiva milícia dos rebeldes em seis meses de guerra tribal/civil.

Terça-feira passada Belhaj já estava a regozijar-se acerca da batalha vencida, com as forças de Gaddafi a escaparem "como ratos" (note-se que é a mesma metáfora utilizada pelo próprio Gaddafi para designar os rebeldes).

Abdelhakim Belhaj, também conhecido como Abu Abdallah al-Sadek, é um jihadista líbio. Nascido em Maio de 1966, ele aperfeiçoou as suas qualificações na década de 1980 com os mujahideen no Afeganistão.

Ele é o fundador do Libyan Islamic Fighting Group (LIFG) e é de facto emir – com Khaled Chrif e Sami Saadi como seus representantes. Após a tomada do poder em Cabul, em 1966, o LIFG manteve dois campos de treino no Afeganistão, um deles a 30 quilómetros a Norte de Cabul – dirigido por Abu Yahya – era estritamente para jihadis ligados à al-Qaeda.

Após o 11 de Setembro, Belhaj transferiu-se para o Paquistão e também para o Iraque, onde auxiliou nada menos do que o ultra-asqueroso Abu Musab al-Zarqawi – tudo isto antes de a al-Qaeda no Iraque prometer lealdade a Osama bin Laden e Ayman al-Zawahiri e turbo-carregar suas práticas pavorosas.

No Iraque, os líbios constituíram o maior contingente de sunitas estrangeiros da jihadi, perdendo apenas para os sauditas. Além disso, os jihadis líbios sempre tiveram super-estrelas nos escalões de topo da al-Qaeda "histórica" – Abu Faraj al-Libi (comandante militar até a sua prisão em 2005, agora mofando como um dos 16 detidos de alto valor no centro de detenção estado-unidense em Guantanamo) até Abu al-Laith al-Libi (outro comandante militar, morto no Paquistão no principio de 2008).

O momento de uma "rendição" extraordinária

O LIFG esteve nos radares da Central Intelligence Agency dos EUA desde o 11/Set. Em 2003, Belhaj foi finalmente preso na Malásia – e então transferido, estilo "rendição" extraordinária, para uma prisão secreta em Bangkok e devidamente torturado.

Em 2004, os americanos decidiram enviá-lo como uma prenda à inteligência líbia – até que foi libertado pelo regime Gaddafi em Março de 2010, juntamente com outros 211 "terroristas", num golpe de relações públicas anunciado com grandes fanfarras.

O orquestrador foi nada menos do que Saif Islam al-Gaddafi – a face modernizadora/London School of Economicas do regime. Os líderes do LIFG – Belhaj e seus representantes Chrif e Saadi – emitiram uma confissão de 417 páginas alcunhada de "estudos correctivos" no qual declaravam ultrapassada (e ilegal) a jihad contra Gaddafi, antes de serem finalmente libertados.

Um relato fascinante de todo o processo pode ser visto numa reportagem chamada "Combatendo o terrorismo na Líbia através do diálogo e da reintegração" ("Combating Terrorism in Libya through Dialogue and Reintegration") [1] . É de notar que os autores, "peritos" em terrorismo com base em Singapura que foram recebidos pelo regime em jantares regados a vinho, exprimim a "mais profunda apreciação de Saif al-Islam Gaddafi e do Gaddafi International Charity and Development Foundation por tornarem possível esta visita".

Crucialmente, ainda em 2007, o então número dois da al-Qaeda, Zawahiri, anunciou oficialmente a fusão entre o LIFG e al-Qaeda no Islamic Mahgreb (AQIM). Assim, para todas as finalidades práticas, desde então o LIFG/AQIM uma e a mesma entidade – e Belhaj era/é seu emir.

Em 2007, a LIFG estava a apelar a uma jihad contra Gaddafi e também contra os EUA e variados "infiéis" ocidentais.

Avançou rapidamente em Fevereiro último quando, como homem livre, Belhaj decidiu reverter ao modo jihad e alinhar suas forças com o engendrado levantamento na Cirenaica.

Toda agência de inteligência nos EUA, Europa e mundo árabe sabe de onde ele vem. Ele já garantiu na Líbia que ele próprio e a sua milícia só ficarão satisfeitos com a lei da sharia.

Não há nada "pró democracia" quanto a isto – nem com qualquer esforço de imaginação. E um tal activo não podia ser desprendido da guerra NATO só porque ele não gosta muito de "infiéis".

A morte em Julho do comandante militar rebelde, general Abdel Fattah Younis – pelos próprios rebeldes – parece apontar a Belhaj ou pelo menos a pessoas muito próximas dele.

É essencial saber que Younis – antes de desertar do regime – fora encarregado das forças especiais da Líbia que combateram ferozmente o LIFG na Cirenaica entre 1990 e 1995.

O Conselho Nacional de Transição (CNT), segundo um dos seus membros, Ali Tarhouni, tem estado a propalar que Younis foi morto por uma brigada duvidosa conhecida como Obaida ibn Jarrah (um dos companheiros do Profeta Maomé). Mas a dita brigada agora parece ter-se dissolvido no ar.

Cale a boca ou corto-lhe a cabeça

Não por acaso, todos os principais comandantes rebeldes são LIFG, desde Belhaj em Tripoli a um Ismael as-Salabi em Bengazi e um Abdelhakim al-Assadi em Derna, para não mencionar um activo chave, Ali Salabi, que tem assento no núcleo do CNT. Foi Salabi que negociou com Saif al-Islam Gaddafi o "fim" da jihad do LIFG, assegurando então o brilhante futuro destes renascidos "combatentes da liberdade".

Não é preciso uma bola de cristal para descrever as consequências de o LIFG/AQIM – tendo conquistado poder militar e estando entre os "vencedores" da guerra – não estar nem remotamente interessado em abrir mão do controle só para agradar os caprichos da NATO.

Enquanto isso, em meio ao caos da guerra, não está claro se Gaddafi está a planear emboscar a brigada de Tripoli na guerra urbana; ou forçar o grosso das milícias rebeldes a entrar nas enormes áreas tribais dos Warfallah.

A esposa de Gaddafi pertence aos Warfallah, a maior tribo da Líbia, com mais de 1 milhão de pessoas e 54 sub-tribos. O que se diz à boca pequena em Bruxelas é que a NATO espera que Gaddafi combata durante meses, se não anos. Daí o prémio estilo Texas-George W. Bush pela sua cabeça e o desesperado retorno ao plano A da NATO, o qual sempre foi de pô-lo para fora.

A Líbia pode agora estar a enfrentar o espectro de uma guerrilha Hidra de duas cabeças; forças de Gaddafi contra um fraco governo central do CNT e botas da NATO sobre o terreno – e a nebulosa LIFG/AQIM numa jihad contra a NATO (se forem marginalizados do poder).

Gaddafi pode ser uma relíquia ditatorial do passado, mas não se monopoliza poder durante quatro décadas por nada e sem os seus serviços de inteligência aprenderem uma ou duas coisas.

Desde o princípio, Gaddafi disse que isto era uma operação apoiada pelo estrangeiro e al-Qaeda. Ele estava certo (embora se tenha esquecido de dizer que isto era acima de tudo uma guerra do neo-napoleonico presidente francês Nicolas Sarkozy, mas isso é outra história).

Ele também disse que isto era um prelúdio para uma ocupação estrangeira cujo objectivo era privatizar e apossar-se dos recursos naturais da Líbia. Ele pode – mais uma vez – estar certo.

Os "peritos" de Singapura que louvaram a decisão do regime Gaddafi de libertar os jihadis do LIFG qualificaram-na como "uma estratégia necessária para minimizar a ameaça colocada à Líbia".

Agora, o LIFG/AQIM está finalmente pronto para exercer suas opções como uma "força política indígena".

Dez anos após o 11/Set, é difícil não imaginar uma certa caveira decomposta no fundo do Mar Arábico a rir descaradamente do reino que vem aí.

[1] Clique aqui: http://www.pvtr.org/pdf/Report/RSIS_Libya.pdf

[*] Autor de 21 O Século Da Ásia (Nimble Books, 2009), Globalistan: How the Globalized World is Dissolving into Liquid War (Nimble Books, 2007) e Red Zone Blues: a snapshot of Baghdad during the surge . Seu último livro é Obama does Globalistan (Nimble Books, 2009). Email: pepeasia@yahoo.com . Para acompanhar o seu artigos sobre a Grande Revolta Árabe, clique aqui .

O original encontra-se em http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/MH30Ak01.html

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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