quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

ECONOMIA - Remessas de capital estrangeiro explicam o rombo nas contas externas.

O Brasil registrou déficit de US$ 47,5 bilhões nas transações correntes do balanço de pagamentos em 2010. O valor é recorde em termos absolutos e corresponde a 2,28% do PIB, o que significa um avanço apreciável em relação a 2009, ano crítico para a economia nacional, em que o saldo negativo em conta corrente ficou em US$ 24,3 bilhões ou 1,52% do PIB. A renda apropriada pelo capital estrangeiro e remetida ao exterior é a principal causa do rombo.
Em dezembro, houve déficit de US$3,5 bilhões no mês. Mas o balanço de pagamentos (que inclui conta corrente e conta de capital) registrou superávit de US$ 2,8 bilhões. Em 2010 o saldo foi positivo em US$ 49,1 bilhões, de acordo com os números divulgados nesta terça-feira (25) pelo Banco Central.

Comércio foi positivo

A conta corrente é uma medida ampla do balanço de pagamentos. Computa os resultados das exportações e importações (balança comercial), remessas de lucros e dividendos, viagens internacionais, pagamentos de juros, frete e transferências unilaterais.

A análise dos números mostra que a responsabilidade pelo resultado negativo não pode ser atribuída à balança comercial, que terminou o ano com saldo positivo, apesar da guerra cambial e da valorização do real. O valor das exportações excedeu o das importações em US$ 20,278 bilhões no ano, o que se deve basicamente à forte recuperação dos preços das commodities, que também influenciam a aceleração da inflação.

Multinacionais

O que mais pesou na determinação do déficit foram as remessas líquidas de renda para o exterior, realizadas pelo capital estrangeiro. Somaram US$ 39,6 bilhões, 17,4% acima do valor apurado em 2009. O destaque ficou para as remessas totais (líquidas) de lucros e dividendos, realizados pelas multinacionais, de US$ 30,4 bilhões, 20,4% a mais na comparação com 2009. O pagamento de juros da dívida externa somou US$ 9,7 bilhões, com aumento de 6,8% na comparação com o ano anterior. Há muito no Brasil não há maiores restrições às remessas de lucros e dividendos, que no passado foram alvo de acirrada polêmica. A limitação e taxação das remessas pelo governo João Goulart nos anos 1960 é apontado como um dos motivos para a implantação da “ditabranda” em 1964.

A conta de serviços (que inclui viagens internacionais, transportes, aluguel de equipamentos, de royalties e licenças, computação e informação) também apresentou um déficit relevante, de US$ 31,1 bilhões, com acréscimo de 61,4% na comparação com 2009. O item turismo (viagens internacionais) apresentou déficits de US$ 1,1 bilhão em dezembro e de US$ 10,5 bilhões, no ano, com receitas e despesas alcançando valores anuais de US$ 5,9 bilhões e de US$ 16,4 bilhões, respectivamente.

Valorização do real

O câmbio teve papel proeminente no resultado dessas contas. A valorização do real elevou o valor em dólares dos lucros apropriados pelas multinacionais instaladas no país e também o das remessas, intensificadas pela crise, ocasião em que as matrizes dos monopólios estrangeiros demandam mais dinheiro de suas filiais para fazer frente aos prejuízos. O dólar barato também estimula viagens ao exterior das camadas de maior renda e explica o resultado desfavorável do turismo.

O ingresso de investimentos estrangeiros diretos chegou a US$ 15,4 bilhões em dezembro e acumulou US$48,5 bilhões no ano (representando 2,33% do PIB), valor que superou e cobriu com folga o déficit em conta corrente, contribuindo ao lado dos outros investimentos estrangeiros (em títulos e empréstimos), para o superávit do balanço de pagamentos.

Efeitos colaterias

Autoridades do governo louvaram o comportamento dos investimentos diretos, aparentemente sem atribuir maior importância aos efeitos colaterais dessas aplicações, que aumentam o passivo externo líquido do país e ampliam as remessas futuras de lucros e dividendos, que avançaram de forma extraordinária ao longo dos últimos anos, desbancando a dívida externa, que fechou dezembro em US$ 255,7 bilhões.

A perspectiva para este ano é de um novo recorde do déficit em conta corrente, que deve subir a mais de US$ 60 bilhões. Enquanto os investimentos externos foram suficientes para financiá-lo o rombo nesta conta, neutralizado pelo superávit na conta de capital, não será percebido como problema. A boa performance das reservas, que somaram US$ 288,6 bilhões em dezembro, também afasta a possibilidade de crise no front externo em curto prazo.

Despreocupado

A experiência ensina, porém, que tal situação pode mudar na hipótese de uma reversão do fluxo internacional de capitais, que hoje favorece o Brasil e outros países emergentes em função do crescimento desigual dos PIBs. Até o momento, porém, o governo não demonstrou maior preocupação com o tema e não acenou com medidas para conter a evolução do déficit.

Os números do BC sobre o setor externo também sinalizam o avanço das multinacionais brasileiras no exterior. Os investimentos brasileiros diretos no exterior somaram, em dezembro, aplicações líquidas de US$ 4,7 bilhões, acumulando US$ 11,5 bilhões, em 2010, compreendendo US$26,8 bilhões em aquisição líquida de participação no capital de empresas no exterior e amortizações líquidas de empréstimos de intercompanhias de US$ 15,3 bilhões. Tais valores ainda são bem menores do que os investimentos estrangeiros no Brasil (em termos de luxo e estoque), mas têm crescido notavelmente ao longo dos últimos anos.

Da redação, Umberto Martins/Site O Vermelho.

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