quinta-feira, 22 de julho de 2010

POLÍTICA - Uma oportunidade para a Federação.

Por Mauro Santayana

O candidato à Vice-Presidência que arranjaram para José Serra voltou a dizer o que não deve, nem poderá provar, ao acusar o PT e, por extensão, sua candidata, de ligações com as Farc e o narcotráfico. De nada valem as explicações ambíguas do próprio Serra. Indio da Costa já demonstrou que não pode exercer a Presidência da República por um minuto sequer.

Com todo o respeito pelos três candidatos, nunca houve pleito tão desestimulador na história da República. Em razão disso impõe-se o entendimento entre os governadores e senadores que se elejam, a fim de criar instrumentos de sustentação da República contra eventuais crises políticas. Situações como a atual reafirmam a necessidade de se retornar a 1891, ao projeto federativo republicano, que tem sido corroído durante todo este tempo. Argumenta-se, com alguma razão, que as federações que se originam de estados unitários passam pela mesma dificuldade. É mesmo possível que, no interior das repúblicas federativas, constituídas sobre estados centralizados, atue uma espécie de reação conservadora, nostálgica do sistema anterior. Em nosso caso, no entanto, a ideia federativa esteve na origem dos movimentos de independência, como tendência natural da formação do Estado brasileiro. O centralismo imperial, a partir de Pedro I, significou, sim, atitude contrarrevolucionária. Desde a frustrada Assembleia Nacional Constituinte de 1823, a proposta federativa, que havia sido claramente exposta pelos conjurados mineiros de 1789, se reanimou, e ocupou a vida política nacional nos decênios seguintes. O pacto federativo de 1891, ainda que tímido, diante das dificuldades de um país de grande extensão territorial, escassa população naquele tempo e falta de escolaridade, era mais nítido do que o de hoje. Pouco a pouco a União foi erodindo o poder dos estados. A Constituição de 1946 não foi capaz de reconstruir o acordo dos primeiros constituintes republicanos. A agressão começou a se tornar intolerável com o governo militar, mediante a intervenção descarada nos estados. O governo de Fernando Henrique Cardoso foi mais ousado do que todos os outros, concentrando, a partir de expedientes tributários, os recursos em Brasília de forma exasperante; impondo a privatização de empresas estaduais, entre elas os bancos públicos; eliminando os instrumentos de financiamento de caixa, como a emissão de títulos estaduais, as conhecidas “apólices” das unidades federadas, que serviram de lastro a obras de infraestrutura. Entre outros exemplos da importância desses títulos, quase todos subscritos pela população local, temos o de Juscelino, em Minas. Foi com eles que o Estado abriu ampla malha rodoviária e iniciou a construção de suas grandes usinas hidrelétricas.

Ainda que a corrupção ocorra em todas as esferas de governo, ela é tanto maior quanto maior seja a concentração do poder. A União surge da delegação dos estados, base da vontade política dos cidadãos e fonte real dos recursos fiscais. Não pode ser o contrário, quando a distribuição dos recursos e os planos de desenvolvimento regional têm sido vistos, nos últimos decênios, como generosidade do presidente da República e de seus ministros.

Os atuais candidatos à Presidência e à Vice-Presidência da República foram escolhidos em São Paulo e em Brasília, sem que as forças políticas do resto do país fossem ouvidas. Os novos governadores e senadores têm o dever de reafirmar os direitos políticos de todos os brasileiros, com a restauração da República Federativa. Essa é a reforma que a razão política exige.

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