sábado, 21 de novembro de 2009

ECONOMIA - Os barbeiros de Brasília.

Luis Nassif: Os barbeiros de Brasília

A crise de 2008 expôs de maneira ampla as vulnerabilidades do Banco Central para enfrentar o turbilhão. A entrevista do diretor de Política Monetária, Mário Torós, ao Valor Econômico detalhando as estratégias do banco e levando à sua demissão é sintomática sobre os problemas da captura de agências públicas pelo mercado.

por Luis Nassif para a Carta Capital

A crise brasileira do ano passado foi fundamentalmente centrada no mercado de crédito. Da noite para o dia o crédito bancário foi suspenso, tanto nas linhas externas quanto internas. Com a suspensão do crédito externo, os clientes prime se voltaram para o mercado doméstico, expulsando pequenas e médias empresas.

O desafio maior consistia em recompor rapidamente o crédito e impedir o aprofundamento da crise. Em circunstâncias normais, as factoring poderiam suprir o mercado de médias e pequenas empresas. Mas aí os erros do BC começaram a aflorar.

Quando grandes grupos exportadores reagiram contra a apreciação excessiva do real, o Banco Central estimulou as operações de “swap reverso” na BM&F. Tratava-se de uma operação que permitia a uma das partes ganhar sempre que o real se apreciasse. Durante anos permitiu-se que investidores de todos os tipos – especialmente os grandes grupos exportadores – auferissem lucros extraordinários. Na ponta perdedora, invariavelmente, ficava o BC. Apenas em 2007, o Tesouro perdeu 10 bilhões de dólares com essas operações.

No primeiro semestre de 2008, não poucas vezes o BC foi alertado sobre os riscos do jogo. Enquanto o real se apreciasse, o Tesouro perderia. Quando algum evento externo provocasse desvalorização brusca do dólar, as perdas seriam do setor privado, podendo levar a uma crise sistêmica.

Não deu outra. Quando a crise estourou, sabia-se que alguns grandes grupos brasileiros tinham se entupido de derivativos, nessas operações de “swap reverso”. Mais ainda. Bancos de investimento estrangeiro também tinham espalhado bombas tóxicas por outras empresas. Como eram operações internacionais, não era possível o mapeamento do valor total dos derivativos tóxicos. Sem saber quem eram as empresas baleadas, o mercado de crédito parou, tanto no bancário quanto nas factorings.

O BC passou meses e meses sem cuidar de levantar todas as informações sobre o mercado de derivativos podres no Brasil. Os recursos do compulsório liberados para os bancos acabaram esterilizados em operações compromissadas com o BC – as instituições financeiras aplicaram em títulos do governo. Em dezembro, com a economia desmanchando, o BC insistia que a atividade econômica estava robusta.

Agora, às portas do ano eleitoral, poucas mudanças devem ocorrer no BC. Havia esperanças na Fazenda de que, com o afastamento de Henrique Meirelles da presidência para disputar as eleições, seu lugar pudesse ser ocupado por Alexandre Tombini, economista ortodoxo, mas funcionário de carreira e dotado de espírito público.

Mas parece ter caído a ficha de Lula a respeito do fator de instabilidade em ano eleitoral que a excessiva apreciação do real poderá se constituir. O mais provável é que nos próximos meses ocorra um processo gradativo de desvalorização controlada do real, conduzido pela nova diretoria do BC, ainda sob o comando de Meirelles.

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