quinta-feira, 26 de março de 2009

PETRÓLEO - "Estamos em Greve": crônica de um piquete petroleiro.

Na noite do dia 23 de março, a chuva batia com força na rodovia Washington Luiz, inundando o caminho para a Refinaria de Duque de Caxias (Reduc). No local, à meia-noite, realiza-se a mudança de turno na produção de gasolina e óleo diesel. Para uma greve, esse é o setor mais importante.

Por Achille Lollo*, no Brasil de Fato

60% da produção ativa (refino de gasolina e óleo diesel) não podem ser estocadas. Na Reduc, 70% da gasolina e do óleo diesel são logo retirados pelas distribuidoras. Paralisar este setor significa provocar a descolagem de todo o ciclo de produção da Petrobras. A estatal tem condição de estocar nessa refinaria apenas produtos de segunda linha, como a parafina.

Não por acaso, João Antônio de Moraes, coordenador da FUP, afirma que, se a greve dos petroleiros paralisar esse setor da Reduc, os diretores da estatal devem pensar seriamente no pacote de reivindicações dos trabalhadores. Por outro lado, parar a refinaria — já com o primeiro turno da noite — significa dar o sinal político claro e decisivo para toda a categoria, as centrais e a sociedade. Pois, apesar da mídia tentar minimizar o peso político dos petroleiros, essa greve é para valer.

Mosquitos e piquete

A chuva finalmente parou e a entrada principal da Reduc — Porta 01 — aparece iluminada com centenas de lâmpadas para mostrar seus guardas, enquanto milhares de mosquitos voam debaixo das faixas de luzes dos refletores.

A seguir, o enxame tenta fazer com os grevistas o que a turma do Sergio Gabrielli, presidente da Petrobras, não conseguiu: romper o piquete. Eles picam tudo o que cheira a carne fresca, isto é, os militantes do Sindicato dos Petroleiros de Duque de Caxias (Sindipetro-Caxias), da FUP e da CUT, que pacientemente esperando os 27 ônibus que levam os trabalhadores do turno da meia-noite diretamente para o interior da refinaria.

O piquete é pequeno, mas compacto. Nada de violência, vulgaridades ou ameaças. Apenas uma longa faixa: “Estamos em Greve”. O som de Paulinho da Viola rompe a monotonia e a tensão noturna.

Chegam os primeiros carros de trabalhadores especializados em operações especiais e logo o coordenador do Sindipetro-Caxias, Simão Zanardi, explica o porquê da greve, convidando-os a aderir. Aos poucos, os carros recuam e seus ocupantes se juntam na praça em frente à Porta 01, diante da raiva — muito bem dissimulada — dos vigilantes e dos gerentes que foram todos convocados, inclusive aqueles que estavam em férias.

Chegam os 27 ônibus

De longe, a fila dos ônibus que vem para a Reduc se parece uma grande cobra coral, cujas cores resplandecem com a luz da lua. Saem da rodovia Washington Luiz e vêm em direção à Porta 01. Já no último desvio aparece um grupo de vigilantes que faz sinal para ir em frente e não parar.

O encontro com o piquete é sempre dramático, porque as expectativas de alguém querer furar a greve ou, pior, alguém ter sido orientado a provocar confusões com o pessoal do piquete é um perigo que existe. O pessoal do sindicato respira a fundo e, segurando a faixa, levanta os braços para que os motoristas dos ônibus vejam. Simão Zanardi está no meio da rua pedindo ao primeiro ônibus para parar.

Finalmente o motorista para e abre a porta. O sindicalista sobe e explica aos trabalhadores o motivo do piquete. A seguir um se levanta e sai. Depois, outro seguido, por mais dois. A única mulher também pega sua mochila e é seguida por três, quatro, cinco, seis, sete, oito operários que se vão para a praça em frente à Porta 01.

O primeiro ônibus entra vazio na Reduc. O segundo avança, o motorista encara Zanardi e solta um alegre: “Companheiro, não veio ninguém trabalhar, o ônibus está vazio”. E, assim, o tempo passa com ônibus literalmente vazios e outros com poucos trabalhadores. A maioria, que havia votado a favor da greve até o dia 20, preferiu ficar em casa, inclusive em uma noite cheia de trovões, relâmpagos e chuva.

Quando o 27º ônibus descarrega seus poucos ocupantes, Zanardi e seus companheiros respiram fundo. A greve iniciou, e bem. No turno da noite, apenas um pelego foi trabalhar. Aliás, foram dois, mas este, ao ver sua seção deserta, deve ter tido um escrúpulo de consciência e logo voltou atrás, juntando-se aos outros que agora enchiam a praça da Porta 01.

* Achille Lollo é jornalista italiano.
Fonte:Site O Vermelho.

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