sexta-feira, 25 de julho de 2008

IMIGRAÇÂO - Entrevista com o Presidente da Casa do Brasil em Portugal.

ENTREVISTA A GUSTAVO BEHR

Por que causou tanto
escândalo a directiva
do retorno, a ponto de
ser logo chamada de
“directiva da vergonha”?
A directiva causou muito escândalo
e muito choque por
causa de artigos verdadeiramente
escandalosos. O artigo
que permite que um imigrante
não-regularizado na Europa
possa ser detido por 18 meses.
As crianças – ao contrário de
toda a legislação de protecção
de crianças – podem ser detidas
e expulsas. Mas mais do
que isso tudo, existe um sinal
que a Europa está dando para
os seus imigrantes.
É que eles estão na Europa,
trabalhando, ajudam os países
europeus nas questões de
demografi a - porque a Europa
está perdendo população
-, promovem a interculturaldiade;
mas a Europa não os
reconhece, e diz que a forma
de resolver os problema dos
imigrantes não-regularizados
não é integrá-los, não é reconhecer
o seu contributo, mas
sim afastá-los expulsá-los.
Isto é, em vez de uma
directiva de retorno, devia
haver uma directiva de
integração...
Isso mesmo, os países deviam
era pensar como regularizar
essas pessoas. Há tantos
estudos que mostram que a
Europa precisa de imigrantes,
que o que se devia ponderar
era integrar essas pessoas, trazê-
las para a sociedade e tirálas
da clandestinidade, em vez
de expulsá-las.
Ainda por cima, estamos no
Ano Europeu do Diálogo Intercultural,
e o que se pensava
era que neste ano se falasse
dessas questões da integração,
das questões da igualdade, da
participação dos imigrantes na
sociedade. E não centrar o debate
da imigração nas questões
da expulsão, do afastamento.
Agora, ainda por cima, vem
aí o chamado Pacto da Imigração
– a França, um país que
tem sido muito restritivo nos
últimos tempos, quer centrar
o debate da Presidência francesa
da UE na imigração e,
com essa directiva, os piores
cenários são possíveis para a
Europa.
Mas o governo português
argumenta que os
imigrantes não devem
preocupar-se, porque a
legislação portuguesa
é mais benéfica que a
directiva, e portanto ela
não vai ser aplicada em
Portugal. Faz sentido dizer
isto?
O governo, perante uma directiva,
pode-se comprometer
no máximo até o fi m dos seu
mandato. Mas essa directiva
escancara a porta para que
qualquer governo português
seguinte aplique os 18 meses
de detenção. As leis comunitárias
são para levar a sério.
A partir do momento em que
existe um determinado nível
estabelecido na directiva, a
tendência das legislações nacionais
é sempre para acompanhar
o que lá está determinado.
Existe algum cálculo
de quantos imigrantes
irregulares existem na
Europa?
É sempre muito difícil contabilizar
a clandestinidade.
Fala-se em oito milhões de
imigrantes irregulares que essa
directiva pode afectar.
Mas é impensável os
governos europeus
expulsarem oito milhões
de pessoas... Além da
expulsão, os governos
europeus dão alguma
alternativa a essas
pessoas? Se não se dá
alternativa, a mensagem
que se está a passar
é que essas pessoas
devem manter-se na
clandestinidade...
É. Em primeiro lugar, os países
europeus não conseguem
expulsar todos esses imigrantes.
Mas o grande efeito da
directiva acaba por ser muito
perverso: as pessoas fi cam
subjugadas pelo medo, com
aquela sensação de que podem
ser expulsas a qualquer
momento... e isso faz com que
procurem menos os seus direitos,
e que estejam mais vulneráveis
à exploração a todos os
níveis, e fundamentalmente à
exploração do trabalho. Mais
do que isso, acaba por fazer
com que os estados europeus,
perante uma directiva tão gravosa
para os imigrantes, se
sintam menos à vontade para
regularizar os que estão nos
seus países, se sintam menos
à vontade para ter políticas
de integração. Porque o sinal
dado pelo Parlamento Europeu
e pelo Conselho de Ministros a
27 foi o de dizer que um imigrante
não-regularizado fi que
detido por 18 meses. Avançase
com uma grande chave para
resolver o problema da imigração
não-regularizada: expulsar
as pessoas da Europa e não
integrá-las.
Os defensores da directiva
dizem que querem
combater a imigração
ilegal, as mafias, o tráfico
de seres humanos e
favorecer a imigração
legal. Eu pergunto-lhe,
como presidente da Casa
do Brasil de Lisboa: é fácil
um brasileiro vir para
Portugal já com a sua
imigração regularizada?
Não, é muito difícil. O processo
é bastante burocrático.
E quando os processos são
muito burocráticos, quando
são muitos os obstáculos, as
pessoas vêm como turistas e
há um mercado que necessita
delas e as convida para fi carem
trabalhando e fazendo a
sua vida em Portugal. Não são
só as pessoas que decidem,
são também os mercados de
trabalho dos países europeus
que precisam delas. Começam
a trabalhar, e é então que
fi cam irregulares, ao fi m de
quatro meses, expirado o seu
visto de turista.
Quem defende que a imigração
não-regularizada se
combate com a expulsão diz:
“O SINAL QUE A EUROPA DÁ AOS
IMIGRANTES É A PRISÃO E A EXPULSÃO”
FONTE: Jornal do Bloco Esquerda.

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