sexta-feira, 27 de junho de 2008

PUBLICIDADE - A publicidade como patrimônio público e social.

O anúncio publicitário que você viu hoje no jornal, na TV, na internet, no rádio ou em qualquer mídia por aí, já foi pago. E muito bem pago! A publicidade, com todas as cifras envolvidas, é o primeiro imposto direto pago pelo cidadão, ou se quiser, pelo consumidor. O faturamento da mídia em 2007, no Brasil, ultrapassa os R$ 26 bilhões. Segundo dados da revista Meio e Mensagem, só as Casas Bahia, representam nesse montante mais de R$ 1 bilhão, correspondente aos seus comerciais diários. Da mesma forma, outro bilhão desse negócio é composto pela verba publicitária do governo federal e de suas empresas estatais.

Com esses números, podemos perguntar: quem paga essa conta? Bem, a das Casas Bahia é você, leitor, quando compra aquele fogão ou geladeira novos. A do governo, todos conhecem: também é você!

O entendimento de que a publicidade é o primeiro imposto direto é compartilhado por pesquisadores e pensadores da comunicação, como Oliviero Toscani, antigo fotógrafo da Beneton italiana, Roberto Menna Barreto, escritor, e Ladislau Dowbor, professor e economista. Segundo Dowbor, em seu ensaio Democracia Econômica, em 1998 o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) apontava que o mercado publicitário planetário girava em torno de US$ 430 bilhões. Outros estudos, de 2001, indicam um movimento superior a US$ 1 trilhão.

O fato é que quando compramos um produto, qualquer que seja ele, não está discriminado o que estamos pagando ali. Na composição de preço também estão embutidos os custos referentes à pesquisa, marketing, royalties, designs, trabalhos jurídicos e, é claro, publicidade. Juntos, eles podem ultrapassar 75 % do valor cobrado. Porém essa informação nos é negada.

Além de pagar bem caro pela publicidade que compulsoriamente vemos, somos também submetidos a bobagens e criações grotescas. O caso dos automóveis é emblemático: os comerciais mostram super carros que deslizam suaves pelas areias das praias ensolaradas, ou que andam em alta velocidade com conforto total nas cidades. Essa realidade é linda, não fosse o sal do mar que vai enferrujar o veículo, e os congestionamentos das marginais ou da avenida 23 de Maio em São Paulo, por exemplo. Para comprovar a falácia da realidade construída pela publicidade, segundo pesquisas sobre o trânsito em SP, há cem anos a velocidade média dos veículos na cidade era de 16 Km/h, com carroças, e alguns bondes. Hoje, com os carros super potentes, a velocidade é a mesma.

Papel da midia Qual é a responsabilidade dos veículos que publicam esses anúncios? O que a mídia tem a ver com nossas vidas?

Ao que tudo indica é que o negócio das grandes corporações de comunicação está focado na venda do espaço publicitário – venda de mídia – e não no conteúdo supostamente produzido a partir do compromisso de veículos e editoras com seus públicos. É a venda pela venda, não o conteúdo para seus leitores, ouvintes, internautas, transeuntes ou telespectadores.

O que nos atinge hoje é saber que fizemos muitas coisas erradas nos últimos dois ou três séculos – na dita era moderna. Pelo que se sente no ar, nossas vidas estão à beira do abismo: dois terços da população ainda vivem abaixo da linha da pobreza, dezenas de guerras acontecendo, aquecimento global, destruição dos ecossistemas, entre mais algumas barbáries. Mas isso parece que não tem nenhuma relação conosco, porque está fora da mídia! Da mesma forma, o debate sobre a sustentabildade ou sobre a qualidade de nossas vidas e de nossos filhos, temas que parecem um centro importante para o debate sobre nossa existência, também estão distantes da comunicação de massa; e é claro, da publicidade.

Em qualquer jornal nacional, regional ou municipal é comum ver páginas com anúncios dos últimos modelos dos carros mais lindos de tal concessionária. Depois de algumas páginas, é claro, certamente estará a marca concorrente. Haverá um repórter para incluir na pauta – entre notícias tão importantes como o caso Nardoni e a presença de Gisele Bündchen na São Paulo Fashion Week – uma matéria que aponta o excesso de veículos como uma das principais causas do congestionamento? E que o nível de poluição nunca havia chegado aos patamares atuais?

Em um caso como esse, qual é a posição desse veículo de comunicação? Ajudar a vender mais carros e entulhar as vias daquela cidade, ou debater com a população as alternativas de vida ou de sobrevivência? Qual é o papel dos veículos de comunicação? Qual é o papel da mídia e dos espaços publicitários?

Um debate na sociedade deve acontecer: a democratização das verbas publicitárias. Quando pagamos qualquer tipo de imposto, queremos que aquele recurso seja administrado e utilizado corretamente e que atenda as necessidades reais e concretas a que se destina, para todos, como a melhoria das estradas, a qualidade na saúde, o saneamento básico nas nossas cidades, e assim por diante. Para a publicidade, os pressupostos devem ser os mesmos.

A publicidade deve receber maior atenção e controle social, para que a banalidade e abusos à nossa inteligência não sejam permitidos, de forma que o espaço publicitário tenha relação direta com as necessidades das pessoas, apresentando conteúdos mais sofisticados e de interesse público.

Da mesma forma, o dinheiro da publicidade – a verba publicitária – deve ser direcionado a todos os veículos que tenham penetração segmentada, mesmo que os seus índices de Custo Por Mil, metodologia a nosso ver ultrapassada, não apontem números satisfatórios, considerando sim a participação desse veículo como mais um canal de relacionamento e de comunicação social, devendo, dessa forma, fazer parte dos planos de mídia das empresas e dos governos. Medidas como estas democratizariam os recursos publicitários e fortaleceriam pequenos veículos de comunicação, seja de distribuição nacional, seja regional, que hoje ficam à margem dos investimentos em mídia, além de garantir a todos o direito à comunicação.

É dentro dessa perspectiva que as proposições lançadas pelo Fórum de Mídia Livre são fundamentais para estabelecer um novo diálogo na sociedade, percebendo a publicidade como um patrimônio público e social

Claiton Mello, jornalista e gerente de Comunicação e Mobilização Social da Fundação Banco do Brasil.
Fonte: Blog do Rovai.

Nenhum comentário: