quinta-feira, 17 de abril de 2008

O que está em jogo nas eleições do Paraguai.

No próximo domingo, 20 de abril, serão realizadas eleições presidenciais no Paraguai.Pela primeira vez em mais de 60 anos, um candidato da oposição, o bispo Fernando Lugo, ligado a ala progressista da igreja católica, "Teologia da Libertação", tem reais chances de vencer. Se isto vier a acontecer, será derrotada a hegemonia do partido Colorado. Lugo já declarou que vai querer discutir com o governo brasileiro, o tratado sobre a hidroelétrica de Itaipu. Declara que o Brasil não paga um preço justo pela energia consumida.
O texto abaixo retirei do blog Pimentus Ardidus.

O que está em jogo nas eleições do Paraguai

O Paraguai está passando por uma transformação política importante atualmente. Neste mês de abril haverá eleições em que o povo paraguaio terá a chance de mudar sua história de eterna vítima de complôs políticos, corrupção, perda da soberania e ataques ao seu direito pleno de desenvolvimento como nação emancipada.
A história do Paraguai é muito triste. Desde seus ditadores antes da Guerra do Paraguai (como a conhecemos aqui, lá é Guerra do Brasil) até os dias de hoje. Sempre governados por representantes da elite econômica e política daquele país, os interesses da maioria sempre foram sobrepujados.
Fernando Lugo é o candidato do povo. E certamente serão os interesses deles que podem ser conflitantes com os de uma parte da sociedade brasileira e da argentina e que esse ex-bisoo católico terá de enfrentar para poder governar para a maioria.
Esse assunto é recorrente ao Pimentus devido a importância da possibilidade desta eleição. Já que Fernando Lugo não pertence a elite econômica e política paraguaia. Certamente há fatores que devem estar tentando impedir a todo custo sua eleição, mas quem é que segura a força do povo?
Acompanhem abaixo a entrevista que o Renato Rovai, editor da Revista Forum disponibilizou em seu blog e eu reproduzo aqui;
O amigo e jornalista Maringoni que visitou o Paraguai nos últimos meses e que tem acompanhado com atenção a eleição no país vizinho, nos concedeu a entrevista que segue por email. A análise dele é a demonstração mais clara de como nossa midiazona poderia ter muito mais qualidade. Não deixe de ler um trecho do editorial de hoje do jornal ABC Color que o Maringoni traduziu para este blogue.
O que está em jogo nas eleições do Paraguai neste fim de semana?
Maringoni – Está em jogo muita coisa, a começar pelo predomínio quase absoluto do Partido Colorado na vida do país. Trata-se de uma hegemonia que só encontra paralelo no Partido Revolucionário Institucional (PRI), do México, que se vale de mil e uma artimanhas legais para perpetuar-se no poder. Neste domingo, este domínio de 65 anos de uma agremiação que governou mais da metade deste tempo através de uma ditadura sanguinária, como a de Alfredo Stroessner, pode acabar. Além disso, as eleições representam possibilidade de novos setores sociais chegarem ao governo. Isso pode acarretar mudanças substanciais nas relações com o Brasil, a maior economia da região.
Se o bispo Fernando Lugo, favorito nas pesquisas, vier a ganhar, o que você acha que pode vir a mudar de fato no país?
Maringoni – Lugo está à frente de uma amplíssima coalizão social e política. Ela envolve quase duas dezenas de agrupamentos políticos, 68 movimentos e organizações sociais e alcança desde a esquerda socialista até um setor da burguesia paraguaia. O ponto de unidade é a revisão do tratado de Itaipu, firmado em 1973, pelas ditaduras Médici, no Brasil, e Stroessner, no Paraguai. Como se sabe, o Paraguai, pelo acordo, deve vender preferencialmente seu excedente energético ao Brasil. Os preços da eletricidade, neste caso, são até quatro vezes menores que a média do mercado. Como os ingressos de Itaipu representam a principal fonte de financiamento do Estado paraguaio, a questão torna-se vital para qualquer governo que queira aumentar gastos sociais e ampliar o investimento público. O mesmo acontece em relação à hidrelétrica construída em parceria com a argentina, a de Yaciretá. A questão da soberania hidrelétrica, como eles dizem, envolve preços e a possibilidade de o Paraguai vender sua energia a quem desejar, tornou-se mais que um mote de campanha. É um tópico de afirmação nacional, sobre a qual nenhum candidato tem condições de se contrapor. A campanha de Lugo é a que mais claramente formula essa diretriz. O Brasil não quer a revisão do acordo, o que encareceria parte da energia de Itaipu. No fundo, a revisão deverá se materializar em uma negociação de preços com o Brasil e a Argentina. Como toda negociação internacional, envolverá questões econômicas e, sobretudo, políticas. A possibilidade de um governo Lugo realizar reforma agrária, gerar empregos, investir em saúde, educação etc. está totalmente subordinada a esta renegociação energética.
Você poderia relatar qual o clima no país, como estão os movimentos sociais em relação a essa possibilidade de vitória de Lugo? Há um sentimento de esperança de mudança nas camadas populares?
Maringoni – Eu não estou no Paraguai no momento e as informações destes últimos dias são fornecidas pelos relatos de amigos que lá estão e pela leitura dos jornais locais. O que se vê é uma sucessão de denúncias de fraudes sobre registros eleitorais e um aumento do sentimento contra a supremacia econômica do Brasil e da Argentina. Ataques preconceituosos contra Lugo aumentam de intensidade nesta última semana. De outra parte, o principal jornal paraguaio, ABC Color, próximo ao Partido Liberal Radical Autêntico, que indicou o vice de Lugo, faz campanha aberta pelo ex-bispo. O editorial de capa desta quarta feira é significativo sobre a visão de uma parte das classes dominantes locais. Ataca a supremacia brasileira e argentina e a continuidade colorada. Até domingo o clima deve esquentar. E nos dias seguintes, a batalha se dará na apuração. A possibilidade de fraudes é muito grande. Os colorados não querem largar o osso facilmente.
Maringoni ainda nos encaminha a tradução de um trecho do editorial do ABC Color de hoje.
É interessante para se ter uma idéia do clima no país vizinho e de como o Brasil é considerado atualmente um subimpério em muitos países da América Latina:
Brasil e Argentina são os principais corruptores do Paraguai
“O triste destino histórico de nossa província paraguaia foi ficar incrustada entre lusitanos e portenhos. Isso determinou grande parte de nossos infortúnios posteriores e os que atualmente nos assolam. Tivemos de lutar contra as ambições de ambas as potências desde a época colonial. Depois, o século XX foi o da colonização e exploração econômica, da qual Itaipu e Yaciretá são hoje suas maiores e mais humilhantes expressões. Os políticos brasileiros e argentinos vinculados a essas administrações são, por suposto, sócios e cúmplices e assessores próximos dos corruptos locais. Todos eles sabem que enquanto os colorados conservarem o poder no Paraguai terão oportunidade de seguir roubando nossa energia de Itaipu e Yaciretá”.

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