sábado, 5 de abril de 2008

De escândalo em escândalo, a mídia jornalística afunda no pântano

Interessante o artigo do Prof. Dennis publicado no blog Revista Fórum, comentando a revelação do jornalista Ricardo Noblat, que deixou a tucanada mostrar o bico. Ficou claro as estreitas ligações da oposição com a grande mídia, caracterizando esta, como bem definiu o Paulo Henrique Amorim, o PIG, Partido da Imprensa Golpista.
A Dilma Roussef, à quem cabe a coordenação das ações de todos os ministérios com as ações dos 27 estados e municípios, virou o alvo a ser abatido, assim como serão todos aqueles da base governista, que vierem a apresentar chances de disputar a presidência da república com sucesso.


Opinião: De escândalo em escândalo, a mídia jornalística afunda no pântano
Por Dennis de Oliveira [Sexta-Feira, 4 de Abril de 2008 às 12:31hs]
O insuspeito Ricardo Noblat jogou água no chope da grande mídia, interessada em criar mais um escândalo para atingir o governo federal. Afirmou taxativamente em seu blog que o autor do vazamento do suposto dossiê de gastos do governo FHC, atribuído à Casa Civil, foi o senador tucano Álvaro Dias (PSDB). O mesmo parlamentar que o deputado federal Ciro Gomes (PSB) afirnou estranhar, em entrevista concedida a revista Caros Amigos em 2005, de que pagava despesas de produção de material de campanha “em dinheiro vivo”. Ou ainda que foi o responsável por pagar a passagem e instruir um “cidadão idoso indignado” que jogou uma torta na cara do ex-ministro José Dirceu, quando do início do caso do mensalão. Dois personagens digamos, assim, heterodoxos. Mas cujos atos somente ganham espaço na mídia quando seus atos estão de acordo com o curso natural do pensamento hegemônico. Neste caso, em que uma denúncia de Noblat (sempre apresentado como um grande conhecedor dos bastidores do poder e, portanto, dono da palavra final) atinge um senador da base aliada (apresentado como paladino da moralidade pública, um contraponto ao “populismo” paranaense de Requião), a coisa é abafada. A revista Veja deu amplo destaque, em seu site, a posição de Dias de que não importa quem vazou, mas sim quem fez o dossiê. Noblat faz uma denúncia mais séria no seu blog. De que o que foi vazado é apenas a parte mais branda do suposto dossiê, há uma parte mais comprometedora que ainda não foi divulgada. O vazamento era, assim, uma forma de “chantagear” a oposição de que chumbo mais grosso viria por aí. Dias repassou para a imprensa para contra-atacar a tática dos governistas. No fim, o que se espera é um grande “acordão” para prevalecer a pizza. O dono da palavra final apresentou um raciocínio lógico que compromete vários atores políticos e inclusive aponta para uma perspectiva bem diferente do que pode ser a CPI dos cartões corporativos. Se o autor de “A arte de fazer o jornal diário”, obra que vale apenas pelas belíssimas citações de passagens do livro Cem anos de solidão, de Gabriel Garcia Marquez, é fonte tão importante, porque mereceu apenas uma nota na coluna Toda Mídia da Folha de S. Paulo e foi totalmente ignorado pela Veja, as publicações que mais deram espaço a este suposto “escândalo do dossiê”? Comprometedor, no mínimo levanta suspeitas. Não sou daqueles que defendem teorias da conspiração em que meramente enxergam no noticiário reproduções da “ideologia dominante”. Os processos de produção do jornalismo diário são tão complexos que acredito muito mais em poderes oblíquos nas redações, o que garante autonomia relativa aos profissionais. Vejo, muito mais, uma deficiência na formação ética dos jornalistas, decerto um reflexo da crise de valores da classe média conforme comentei no artigo passado. Hebert Guns, em Deciding what´s news (Paperback, 2005) traça um perfil dos jornalistas dos principais meios de comunicação norte-americanos no final dos anos 60 e demonstra que as suas posições se aproximam de um ideário “progressista”, o que poderíamos classificar como “liberais (no sentido clássico) radicais”, confiantes nas possibilidades progressistas do liberalismo. No Brasil, este ideário sequer existe. Há uma confusão, inclusive nas escolas de jornalismo e entre colegas docentes, de achar que o jornalismo como “quarto poder” é ser contra qualquer poder instituído – ser contra por princípio leva, por exemplo, a esta busca desenfreada por escândalo ou denúncia como faz a Folha de S. Paulo que depois do naufrágio do caso do dossiê, tenta fabricar um novo escândalo com a tese do terceiro mandato de Lula, baseado única e exclusivamente em uma declaração pontual do vice-presidente José de Alencar em um programa de rádio. Por mais que o presidente Lula e seu staff neguem, o jornal insiste em atemorizar a opinião pública com esta possibilidade. Como aterrorizou com a pseudo-epidemia de febre amarela. Ser contra não é ser crítico. Ser crítico exige uma postura intelectual e independente. Coisa que exige mais que uma formação consolidada mas uma capacidade de raciocinar os problemas contemporâneo a luz de conceitos teóricos. Difícil acontecer isto quando a grande imprensa faz uma campanha intensa contra as faculdades de jornalismo – ao invés de tentar fortalecê-las – e adere a postura de uma classe média emburrecida que se contenta com mosaicos de informação ao invés de saberes articulados e expressa sua condição muito mais por objetos de consumo e construção de simulacros caricatos de Primeiro Mundo. Ser crítico não é aderir a modismos, como a grande midia aderiu ao discursos neoliberais no final dos anos 80, fazendo um verdadeiro jornalismo de campanha pelos preceitos do Consenso de Washington. E ser crítico não é ser denuncista e agir como inocente útil – ou, pior, como consciente útil – de interesses político-partidários que, eventualmente, tenham interesse em desgastar ocupantes eventuais do governo e fabricam escândalos, dossiês, etc. no melhor estilo do “jornalismo porta-treco” como bem define o meu colega Cláudio Tognolli. Que tipo de esfera pública este jornalismo quer construir? Uma no estilo dos basbaques do natimorto movimento Cansei? ________________________ Dennis de Oliveira é jornalista, professor da Escola de Comunicações e Artes da USP, doutor em Ciências da Comunicação pela USP. É presidente do Celacc (Centro de Estudos Latino Americanos de Cultura e Comunicação) e membro do Neinb (Núcleo de Estudos Interdisciplinares do Negro Brasileiro). E-mail: dennisoliveira@uol.com.br

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